A Sloclap é um estúdio francês que havia lançado o seu primeiro jogo de notoriedade há alguns anos, o jogo de luta Absolver. Absolver era um jogo grande demais para uma empresa estreante onde ele tinha como objetivo ser um jogo multiplayer e ainda ter uma história. Apesar de conter boas mecânicas e ter conquistado alguns objetivos, ele sofria com problemas técnicos.
Usando todo o conhecimento adquirido com Absolver, a Sloclap decidiu fazer um jogo mais focado na jogabilidade onde não gastariam tempo e recursos com infraestrutura necessária de um jogo online e anunciaram, Sifu, um jogo beat’em up inspirado em filmes do Jackie Chan, onde ele lutava com diversos inimigos usando artes marciais.
Sifu na cultura chinesa significado “Pai Mestre” no Kung Fu, é usado como um termo familiar e sinal de respeito. O termo também pode ser usado de forma menos íntima, como um aluno que se torna estudante ou discípulo do professor.
Em uma noite de tempestade na China, você assume o controle de um lutador misterioso. O lutador invade uma escola de artes marciais e com ajuda de mais quatro parceiros (Fajar “O Botânico”, Sean “O Lutador”, Kuroki “A Artista” e Jinfeng “A CEO”), massacram no caminho todos os alunos. No topo, o lutador misterioso encontra o sifu da escola, ali descobrimos que o lutador se chama Yang “O Líder” e os cinco invasores são ex-alunos que foram expulsos. O intuito dos cinco é roubar o conhecimento que procuram, o sifu desafia Yang para uma luta e nela Yang o mata.
Yang sente a presença do último aluno vivo da escola escondido dentro de um móvel, o aluno é forçado a sair do seu esconderijo e trata-se de uma criança (que nesse caso pode ser um menino ou uma menina, dependendo da escolha do jogador). Yang ordena que Fajar o mate, que o mata cortando o seu pescoço. A cena corta e logo vemos o menino caído no chão sozinho, mas sem sinais de ferimento, mas com um talismã mágico brilhante nas mãos que embora seu poder seja limitado, ele consegue reviver o seu portador ao custo de anos de vida, causando um envelhecimento acelerado toda vez que é usado.
Oito anos se passaram e você assumirá o controle da criança, que hoje é um jovem de 20 anos, sem nome. O protagonista treinou durante todo esse tempo os ensinamentos das artes marciais com somente um intuito, vingar a morte do seu pai matando os cinco ex-alunos. Assim o jogo se inicia.
Campanha
Sifu é simples e direto em tudo o que se propõe e o enredo de sua campanha segue essa orientação. Como toda narrativa que estúdios ocidentais decidem retratar história e cultura oriental, o jogo possui a premissa simplista de vingança e honra à família. O jogo possui poucas cutscenes ou desenvolvimento de personagens e portanto o protagonista da história é um lutador sem voz e sem personalidade, deixando o jogador somente com a sua origem e motivação.
A campanha se baseia em bater em NPCs, encontrar documentos nas fases que contêm informações sobre a história (na verdade, boa parte do roteiro é contado por meio disso), ter uma conversa prévia com um dos cinco na final da fase e passar para a próxima e repetir o mesmo modelo narrativo.
Os antagonistas do jogo possuem personalidades simplistas e motivações pouco claras, deixando o jogador meio perdido e na dúvida se o roteiro seria raso o suficiente para não ter se esforçado em dar maior profundidade motivacional aos vilões do enredo ou pouco claro deixando o jogador com a sensação de ter perdido algo em alguma explicação.
Por ser um jogo muito mais preocupado em gameplay era claro que sua história teria menos cuidado, já que uma narrativa mais detalhada poderia quebrar o ritmo e dinâmica da sua jogabilidade, mas teria sido melhor ter nos dado um maior contexto das razões de cada um.
Gameplay
Sifu é um jogo de ação e aventura beat’em up, onde você terá que passar por cinco fases. O estilo de arte marcial adotado na jogabilidade é inspirado no Kung Fu. O jogo possui cerca de mais de 150 ataques únicos onde o jogador começa com movimentos e combos simples e poderá adquirir ataques e combos adicionais desbloqueando de forma temporária ou permanente com o uso de experiência ganha ao derrotar inimigos, mas sobre esse tópico é preciso explicar a mecânica diferencial de Sifu.
Mecânica de Morte
Sifu tem uma mecânica de diferente de game over. Seu personagem possui um medidor de saúde e um de morte, cada vez que você morre, esse medidor de morte influenciará nos atributos e na essência do gameplay e para melhor explicação, darei um exemplo:
No jogo você começa com 20 anos, quando você morre, o contador de mortes soma um ponto, com o talismã mágico você pode escolher entre reviver ou reiniciar a fase inteira. Caso você decida reviver, a quantidade de mortes naquela fase será adicionada na sua idade, portanto se você tiver morrido 5 vezes, o contador irá somar mais 5 anos da sua vida, envelhecendo o seu protagonista. Você poderá zerar esse contador derrotando subchefes e chefes ou usando pontos em santuários espalhados pela fase. O jogador não conseguirá mais reviver caso o seu protagonista alcance os 70 anos. Cada vez que você alcança uma faixa etária específica, seu personagem ganha mais força e perde mais saúde além claro de mudar de aparência.
A idade passa também a ser um fator essencial na sua dificuldade, já que a idade que você terminar uma fase será a idade que você começará a próxima, sendo acumulativa em todas as cinco. Portanto, caso você consiga terminar a primeira fase com 30 anos, você irá iniciar a segunda fase com o contador de mortes e idade que você terminou na primeira e assim sucessivamente. Por isso, o jogo vai te forçar a ter que repetir fases para melhorar a sua performance para as próximas e conseguir chegar no final com a melhor faixa etária possível. Essa mecânica pode muito bem ser divertida para jogadores amantes de desafios e replay, mas excruciante para jogadores que detestam ter que repetir fases para melhorar desempenho. Sabendo disso, o jogo implementa um fator de atalho cada vez quem jogador passa uma fase, por meio de chaves e cartões de acesso que destrancam portas e elevadores, cortando uma parte considerável do caminho ou mesmo chegando direto no chefe.
Conforme falado, você ganha experiência ao derrotar inimigos para desbloquear novos ataques e combos, acontece que você pode desbloquear temporariamente ou permanentemente. Ao desbloquear de forma temporária, o jogador só poderá usar aquela nova habilidade enquanto não morrer ou desistir, sendo zerado logo depois. Para desbloquear permanente, o jogador precisa primeiro comprá-la uma vez de forma temporária e comprar cerca de cinco vezes para consegui-la de forma definitiva, obrigando o jogador a ter que repetir diversas vezes caso queira aquela habilidade pra sempre. Outro fator a se destacar é que algumas habilidades somente estão disponíveis até uma faixa etária, caso o jogador com 40 anos decida adquirir uma habilidade que só pode ser aprendido até os 29, ele não conseguirá obrigando o jogador a ter que voltar a fases anteriores para desbloqueá-la.
Indo no mesmo sentido são as habilidades compradas em santuários espalhados pela fase. Nos santuários você terá três opções de melhoria: limitadas à sua idade, melhorias de troca de pontuação e as compradas em troca de experiência. Elas também zeram caso você desista.
Já deu pra entender que a vida do jogador não será fácil, Sifu irá constantemente forçar que o jogador aperfeiçoe suas técnicas e domine os seus combos para evitar o maior dano possível para não envelhecer rápido demais, propondo o “domínio por meio da prática e repetição”. Portanto o jogador terá que repetir diversas vezes fases e memorizar movimentos e estratégias para sub chefes e chefes, se tornando um jogo de paciência e habilidade.
Combos, Fases e Dificuldade
Por ser um jogo concentrado em pancadaria, Sifu cumpre divinamente o propósito ao qual foi desenvolvido. Seu personagem poderá desferir socos, chutes, aparar, defender, desviar de ataques, contra golpear, dar rasteiras, correr e uma variedade grande de possibilidades tornando muito divertido.
Com uma versatilidade e gama grande de combos, isso faz de Sifu uma das melhorias experiências de beat’em up já lançadas no mercado. Os encontros em cada fase ocorrem em hordas, onde vários inimigos vão pra cima de você e cabe ao jogador escolher a melhor estratégia para lidar com cada caso. Sua mecânica é muito parecida com o freeflow, mecânica iniciada nos jogos da série Arkham de Batman lançados inicialmente no PS3. O jogador pode mudar de alvo a um simples toque do direcional seja para atacar, aparar ou defender. É possível usar objetos do cenário para atordoar e portar bastões, espadas, porretes e pedaços de madeiras para bater em inimigos, todos esses objetos são quebráveis, mas você pode melhorar a sua durabilidade no decorrer da fase nos santuários.
Outra mecânica importante no jogo é uma já usada em Sekiro, a barra de defesa ou atordoamento. Cada vez que o inimigo te atacar, ele irá afetar mais e menos a sua defesa, dependendo se ele conseguir te acertar ou você conseguir se defender. Na medida que a sua defesa é quebrada pelo enchimento da barra, você perderá o equilíbrio ficando atordoado ou propenso a receber dano sem conseguir se aparar ou defender, claro que não só você possuirá essa barra, como os inimigos também a terão. Caso você consiga quebrar a defesa dos seus inimigos, você poderá realizar finalizações especiais.
As fases possuem uma estrutura clara, com a sua parte inicial com poucos inimigos e escalando a quantidade e dificuldade na medida que avança. Cada fase possui sub chefes com maiores barras e saúde e defesa que irão te dar certamente dores de cabeça e atrapalhar os seus planos de terminar cada fase com a menor idade possível.
Por ser um jogo bem desafiante, o jogador que achar que sairá atacando uma horda de inimigos sem critério e estratégia, vai acabar se frustrando a cada tentativa. Sifu é um jogo mais de esquiva do que de ataque, se revelando bem mais desafiante do que se espera para um jogo do gênero. Podemos comparar a sua dificuldade com jogos soulslike, onde cada movimento errado é severamente punido e a dificuldade faz parte essencial da sua jogabilidade. Os inimigos não vão esperar a sua vez de atacar ou irão atacar por turnos, todos vão atacar a ritmos próprios, alguns não se importando que você acabe os seus combos, portanto, o jogador que achar que ficará batendo sozinho em uma rodinha de inimigos, vai tomar pancada até aprender a usar de estratégias de bater e correr, escolher um alvo por vez e escolher lugares que não seja flanqueado.
Um problema que notei nas fases é o seu balanceamento, a segunda fase, “O Clube”, é notoriamente a mais difícil do jogo inteiro. Com corredores e áreas com muitos inimigos, sub chefes irritantes e um chefe agressivo, o jogador vai acabar te assustando e frustrando muito cedo, fazendo o jogador perder uma parte considerável de idade já no início do jogo. Faltou um maior equilíbrio, já que a terceira fase, “O Museu”, é uma das mais fáceis do jogo e ao pegar o cartão do elevador, você já consegue acesso total ao chefe.
Outro problema reside na sua câmera. Um erro recorrente em jogos com muitos inimigos em espaços pequenos é que a câmera não consegue se posicionar de forma satisfatória e Sifu sofre desse problema também. Em diversos ocasiões a câmera deixa pontos cegos prejudicando a visão do jogador em enxergar os inimigos, tomando dano mais por culpa do posicionamento da câmera do que do jogador.
Gráficos
Sifu esteticamente não é realista e tampouco avançado para a nova geração, muito pelo tamanho e estrutura da Sloclap, mas adota um visual mais cartunesco e leve, decidindo não adotar elementos mais violentos como sangue. A direção artística faz com pouco muito, com fases brilhantemente desenvolvidas com clubes noturnos fazendo jogos de luzes de neon e até combinando com efeitos sonoros e museus de arte que brincam com perspectivas e expondo verdadeiras obras de arte.
Uma brincadeira que o jogo faz é misturar elementos fantasiosos em cada fase. Cada vilão possui uma fase inspirada no Wu-Xing, a teoria dos cinco elementos chinesa. Nessa teoria, o mundo material seria composto por cinco elementos naturais: Madeira, Fogo, Água, Terra e Metal. O jogo faz uso dessa teoria chinesa nas fases de forma inteligente, seja em florestas de bambus, vilas incendiadas, passagens nevadas, prédios que se transformam em crateras e etc.
O ponto que mais se deve levantar é que Sifu faz diversas homenagens à filmes de artes marciais, como a cena do corredor de Oldboy, a luta na neve de Kill Bill ou prédios cheios de inimigos como The Raid. Acontece que do ponto de vista mais criterioso, Sifu adota elementos da cultura chinesa, mas parece uma salada de inspirações de clichês orientais criadas por ocidentais, que pode passar desapercebido por muitos, e ser criticado pelos mais críticos.
Trilha Sonora e Som
A trilha sonora do jogo é composto pelo Howie Lee, um artista chinês independente. As músicas possuem misturas orientais com uso de instrumentos chineses como Guqin (instrumento de cordas), gamaleões, flautas e o gênero eletrônico com muitas batidas por minuto no geral (BPM). No geral elas cumprem o propósito de imersão e coerência com a proposta do jogo, mas ao meu ver não chegam a brilhar a ponto de serem inesquecíveis.
O jogo não possui dublagem para o português, somente para inglês, mas contêm legendas em português do Brasil. Pelo fato de sua história ser muito básica, não há como julgar dublagem, já que seu protagonista é mudo, os vilões aparecem pouco e os inimigos dizem frases repetitivas e sem muita complexidade, apenas reagindo em poucas situações, como por exemplo, quando você está portando alguma arma.
Vale a Pena?
Sifu é um jogo original e único ao seu modo. Apesar de ter usado diversas referências e mecânicas consolidadas de outros jogos, ele consegue se tornar singular e prova mais uma vez o alto valor que empresas independentes possuem no mercado de games ultimamente, entregando propostas e produtos únicos se arriscando em busca de um propósito.
Com uma história satisfatória, mas não surpreendente, Sifu se volta quase que por completo nas suas mecânicas e na sua jogabilidade, passando uma experiência muito divertida e desafiante. Por ser um jogo onde o ataque sem critério será severamente punido, pode haver rejeição e dividir opiniões sobre a necessidade de sua alta dificuldade, mas é um jogo que não se curva à convenções e segue firme na sua proposta.
Com alguns problemas de câmera, repetição e gráficos, Sifu demonstra sinais claros do tamanho do seu orçamento, mas os sinais mais fortes é que jogos corajosos como ele são muito necessários em um mercado onde o que impera é entregar jogos genéricos adotando estéticas, gêneros e modelos mercadologicamente aceitos. Sifu não, Sifu é videogame na sua raiz.
Código fornecido gentilmente pela Sloclap.
Notas do Jogo
Título: Sifu
Descrição do jogo: Sifu é a história de um jovem estudante de kung fu em uma trilha de vingança, caçando os assassinos de sua família. Um contra todos, ele não tem aliados, mas tem incontáveis inimigos. Ele deve contar com seu domínio único do kung fu e com um pingente misterioso para prevalecer e preservar o legado de sua família.
Gênero: Ação, Beat'em Up, Action-Fightining
Lançamento: 08/02/2022
Produtora: Sloclap S.A.S
Distribuidora: Sloclap S.A.S
Nota
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História - 7.5/10
7.5/10
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Jogabilidade - 9/10
9/10
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Gráficos - 8/10
8/10
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Trilha Sonora e Som - 7.5/10
7.5/10
Veredito
Sifu é um jogo original e único ao seu modo. Apesar de ter usado diversas referências e mecânicas consolidadas de outros jogos, ele consegue se tornar singular e prova mais uma vez o alto valor que empresas independentes possuem no mercado de games ultimamente, entregando propostas e produtos únicos se arriscando em busca de um propósito.
Com uma história satisfatória, mas não surpreendente, Sifu se volta quase que por completo nas suas mecânicas e na sua jogabilidade, passando uma experiência muito divertida e desafiante. Por ser um jogo onde o ataque sem critério será severamente punido, pode haver rejeição e dividir opiniões sobre a necessidade de sua alta dificuldade, mas é um jogo que não se curva à convenções e segue firme na sua proposta.
Com alguns problemas de câmera, repetição e gráficos, Sifu demonstra sinais claros do tamanho do seu orçamento, mas os sinais mais fortes é que jogos corajosos como ele são muito necessários em um mercado onde o que impera é entregar jogos genéricos adotando estéticas, gêneros e modelos mercadologicamente aceitos. Sifu não, Sifu é videogame na sua raiz.
Vantagens
- Combate muito divertido
- Combos contribuem para versatilidade da jogabilidade
- Desafiante
- Direção de arte em algumas fases se destaca
- Trilha sonora na fase “O Clube” faz a diferença
Desvantagens
- História e personagens simples e pouco profundos para um enredo que trata família e honra
- Dificuldade da fase “O Clube” é desbalanceada com o restante
- Câmera atrapalha muito em combates com muitos inimigos
- Necessidade de alta repetição de fases poderia implementar novidades a cada vez que se revisita
- Sistema de compra de habilidades dificulta desnecessariamente o gameplay que já é difícil
- Algumas habilidades se tornam subutilizadas por serem difíceis de um inimigo não defendê-las